Grito Número Oitenta e Cinco:

segunda-feira, 28 de março de 2011

E do alto do Altino Arantes, ecoa uma canção...


"Tem dias que eu digo não
Inverno no meu coração
Meu mundo está em sua mão
Frio e garoa na escuridão
Sem São Paulo
O meu dono é a solidão
Diga sim, que eu digo não"

Inocentes - São Paulo

Grito Número Oitenta e Quatro:

sexta-feira, 25 de março de 2011

NUNCA MAIS INVERNO

Chegou qual sol por detrás de colina mansa, com vagar e vigor.
Os galhos vazios de folhas e repletos de neve cedem lentamente lugar a folhagem verde.
E o gelo no peito se esvai pelo ralo imundo.
Finalmente, chegou o dia em que posso dizer: nunca mais inverno.
E sem bucolismo barato, trato de construir um verdadeiro idílio em pleno subúrbio.
Foram acendidos os estopins e as fagulhas fazem a ânsia pelos fogos de artifício se tornarem o verdadeiro espetáculo da noite.
E a última noite de inverno calada vai embora.
E mesmo os fogos destruindo alguns jardins, a primavera chega violentamente sem clemência.
E agora, junto a aurora, um vento morno me aquece os lábios que subitamente se movem para dizer, quiçá não ilusoriamente, mais uma vez: nunca mais inverno.

Grito Número Oitenta e Três:

domingo, 20 de março de 2011

A Ponte Sobre o Rio Ubá

O céu encontrava a noite
Lusco-fusco teatral
A estrada refletia
A dor mais infernal

Os estilhaços cortaram
O que eu dizia ser eu mesmo
Meu coração de vidro se encheu
Quando eu cruzei a ponte sobre o Rio Ubá

Pressenti o destino podre e miserável
Que sempre soube onde poderia me encontrar
Quando avistei a ponte sobre o Rio Ubá

Quantas almas entenderam meu lamento
Quando meu pobre coração encontrou o cimento
As luzes dos caminhões se puseram a chorar
Quando meu carro encontrou a ponte sobre o Rio ubá

Implorei a minha imaginação
Hesitei em ter vivido em vão
A certeza é o lamento daqueles que se vão
Sempre soube minha hora, sempre soube o meu lugar
Sempre soube que minha alma, pedia para se atirar da ponte sobre o Rio Ubá

As almas choram para ilustrar
Como é assistir o fim de um futuro sem quiçá
Não há mais porvir
Há somente mais um carro, se encolhendo sobre a ponte do Rio Ubá

Infiltrado no caminho das bocas de jacarés
São mil almas na noite que cantam com faróis
Que por pequeno instante pensei se tratarem de dois sóis
Como pude me enganar
Na noite em que fui mais um que desfaleceu na ponte sobre o Rio Ubá

Meu fim foi numa noite
Em que sonhei poder voar
Caí, eu vi, tentei jamais acreditar
Transformações que levam para o lado de lá
Esse foi meu trágico dia
Em que me tornei mais uma alma a chorar
Lágrimas em vão ao relembrar
De mais uma noite maldita e triste sobre o rio Ubá

Toda noite os carros passam para seu destino encontrar
Em um lugar qualquer existe uma curva de medo e morte
Está perto de quem se encontra ao coração do norte,
Norte do Paraná
Numa noite dessas uma gralha azul resolveu grasnar
Para outro homem morto na curva que passa pela ponte sobre o Rio Ubá


Grito Número Oitenta e Dois:

sexta-feira, 18 de março de 2011


Porque se me acorrentassem pela eternidade e eu só pudesse pedir três pequenas coisas para me acompanhar para todo o sempre eu gostaria de um café puro, lápis e papel...


Há milhões de sentimentos em mim, elas fervilham e exercem uma pressão vulcânica.
Precisam sair de qualquer forma.
Como no pugilista que coloca toda sua vida em alguns minutos no ringue.
Como no patinador que dispõe sua vida em saltos mortais.
Como no mendigo que vendeu a vergonha para saciar a fome da noite.
E como eu, um reles qualquer, que quer fazer de uns traços o seu ponto de apoio.
E se para mais alguém servir, fica cada vez melhor.

Grito Número Oitenta e Um:

quinta-feira, 17 de março de 2011

SOBRE EU TENTAR ESCREVER COMO O VELHO BUK...



Estou lendo e me deleitando com "Ao Sul de Lugar Nenhum - Histórias da Vida Subterrânea" de Charles Bukowski. Tentei, como um exercício, me valer do seu estílo escatológico, vagabundo, visceral, verdadeiro e cru de lidar com as palavras, bem como trazer uma narrativa não habitual do que estou acostumado a colocar (ou atirar) para fora. Preparei então a inspiração e encarnei o velho e destrutivo Henry Chinaski. O que surgiu foi um conto, que assim batizei:




COBAIA, COMIDA FRANCESA E NUVENS DE METANO

Albert estava fodido. Andava fodido há anos. Não tinha dinheiro, comia sobras dos restaurantes e recolhia baganas de cigarros nas vielas para montar seu cigarro nos guardanapos que roubava das lanchonetes que colocavam mesas nas calçadas. Eis que houve um dia que um sujeito ruivo, com um grande bigode cor de ferrugem se deparou com aquela figura patética e imunda. Alberto fixou seu olhar naquele bigode laranja e não escutou as duas frases que o senhor enferrujado de sardas havia proferido.

-Hey! Você ouviu o que eu disse?
-Desculpe, não estava prestando atenção.
-Me chamo Larry. Quer ganhar uma grana?
-De quanto estamos falando? - disse Albert jogando, pois aceitaria até um pedaço de pão com mais idade que ele.
-Que tal quinhentos dólares semana?
-Quem eu tenho que matar?
-Lhe explico, quer tomar um café, ali na esquina da Rua Denver?
-Eu aceito uma cerveja.

Caminharam uma quadra e meia até a bendita esquina e se sentaram em uma das mesas do lado de fora da loja. O garçom reconheceu Albert das afanadas de guardanapos, mas se resignou a atendê-los normalmente.
- Um café preto para mim e uma cerveja para meu amigo, por favor.
- Você prefere Pilsen ou Lager?
- Meu amigo, faz tempo que bebo água de viela, me traga qualquer uma, ou a mais gelada.

Larry riu do semblante de asco do garçom esboçado por meio segundo.
-Vamos direto ao ponto - disse Albert.
-Certo. O negócio é o seguinte. Eu não consigo satisfazer plenamente a minha mulher.
-Beleza, eu como ela tranquilo.
Já fazia um bom tempo que Albert não trepava com ninguém, além de suas mãos. Ele usava a mão esquerda para finjir que era uma mulher desajeitada. Idealizou a mulher em questão e até colocou nome
nessa punheta especial de garota falsa.
-Não é bem assim. Você não vai fazer sexo com ela - disse Larry afrouxando sua gravata.
-Me diga... como é mesmo seu nome?
-Albert. Albert Foster Jr..
-Então, Albert, o negócio é que não consigo peidar.
-Que diabos? Não entendi.
-Já ouviu falar em flatofilia? É o prazer sexual atingido através do inalar de peidos.
-E sua mulher curte cheirar peido?
-Ela cismou que quer isso agora. E faço tudo por ela.
-E você quer que eu peide como? Em uma garrafa?
-Não. Nada disso. Você vai encostar o cu no nariz dela e fazer o serviço de uns bons peidos de quinhentos dólares semanais. Enquanto isso eu faço sexo com ela.
-Cara, que coisa doentia.
-Eu acho estranho também, mas é a minha esposa e faço tudo para vê-la feliz. Além do que, você andou comendo muitas coisas estragadas, deve ter uns traques bem fedorentos.
-O que você acha de uma amostra grátis?

Albert levantou uma de suas pernas e soltou uma bufa cuja sonoridade parecia a de mil helicópteros trombando no ar. O aroma da bomba era indiscritível.

- Que nojo, homem. Acho que vou vomitar minhas roscas do café da manhã.
Dito e feito. O mingau azedo que acompanhava o cheiro de flato no ar casaram-se para formar algum tipo de cheiro letal.
Antes que acontecesse o pior naquele espaço onde outras pessoas se alimentam, foram embora.
Larry deixou uma nota de cinquenta dólares pela cerveja e café que não vieram e pelo fedor de vômito e flato que deixaram ali.

-Minha mulher vai adorar, de bônus vai ganhar esse cu que não deve ser limpo desde o crash de 29.
-Em 29 eu nem tinha nascido, caralho! Não avacalha.
-Estava brincando.

Entraram no carro de Larry. E que carro! Um Bentley R Type Continental preto, com as tiras brancas nos pneus dando um toque de requinte luxuoso.
Andaram por quinze minutos com as janelas abertas, pois Albert fedia um pouco, não da peida mortal que soltara, mas do acúmulo de sujeira e craca dos últimos tempos.
Quando chegaram na mansão, Albert já foi assoviando.

-"Fiiiu"! Que cabana!
-Vamos direto ao que interessa.

Deixaram o Bentley com o manobrista e entraram pela cozinha. Albert já foi pegando a garrafa de whiskey que estava sobre o balcão e tratando de dar uns goles.

-O quarto é por aqui. Vanessa deve estar nos esperando.
Subiram dois lances de escada e entraram na porta que estava a direita.
Quando Albert fitou Vanessa ficou no mesmo momento de pau duro. Estava de camisola vermelha, totalmente transparente. Era uma morena de uns vinte e oito anos, no máximo. Novíssima, ainda mais para
um coroa rico de bigode ruivo.
-Esse que é nosso assoprador.
-Assoprador! Ha-ha! - disse Albert.
Foram curtos e grossos. Vanessa já estava de calcinha abaixada nos joelhos e Larry esfregando seu pinto em Vanessa, tentando encontrar uma ereção.
-Vai Albert! Peida nela! - Larry estava estimulado com a alegria de sua ninfeta.
Albert abaixou sua calça de brim surrada e encostou o rabo no nariz da Vanessa e fez força. Não saía nada. Temeu fazer mais força e cagar na boca da mocinha, mas sentiu que uma rajada de vento
à base de metano estava a caminho. Foi um barulho surreal e o cheiro idem.
Vanessa sentiu aquele cheiro repugnante e gozou na mesma hora. Depois quis encerrar as atividades.
-Meus parabéns. Você é um excelente assoprador - disse Vanessa dando um tapinha em sua costas.
-Aqui estão seus quinhentos dólares e mais cinquenta de gorjeta por ter feito um bom trabalho. Pegue esse extra e vá ao "Le Château de Fontainebleu" na Rua Maple, como lá todos os dias, você não irá se arrepender.
Volte amanhã.

Albert não via aquelas cores verdes havia muito tempo. Contou umas vinte vezes o dinheiro.
Pegou um táxi e foi para o centro. Foi ao barbeiro e pediu por um serviço completo. Tirou toda a barba amarela de sujeira e fumaça de cigarros remendados e deixou o cabelo bem curto.
Depois foi ao alfaiate e comprou seu melhor terno. Estava começando a parecer com Larry, exceto pela cor dos pêlos, que de ruivos não tinha nada - era todo grisalho. Estava estiloso e bem apresentável.
Foi ao "Le Château de Fontainebleu" e pediu metade do cardápio. Comeu canapés com caviar, bebeu champanhe francesa e tomou duas garrafas de vinho, comeu um ensopado de vitela e duas tigelinhas de Crème brûlée.
Sentiu vontade de dar um arroto, mas segurou. Pagou tudo e deixou cinco dólares para o garçom.

Foi até o Hotel do Parque e pediu por um quarto simples.
Tirou seu paletó novíssimo e deitou com a barriga estufada.
-Larry tinha razão, valeu cada centavo, comi como um rei - a última palavra saiu arrotada.
Dormiu como um barão cigano.
Quando acordou com o sol violentando sua paz, já era a hora de realizar seus serviços sujos.

Apanhou um táxi e chegou na mansão nada modesta em aproximados vinte e cinco minutos.
-Fique com o troco.
Como da última vez estava o casal pronto para a ação, Vanessa de camisola, desta vez preta, e Larry estava pelado. Tinha os pelos do pinto ruivos também, mas Albert evitou olhar para aquele cano enferrujado, embora chamassem demasiada atenção.
Nem repararam a barba feita de Albert, nem o terno, estavam esperando os peidos.
Já estavam na posição sexual de costume, com Albert encostando seu cu peludo prestes a expelir uma núvem de sabores sombrios no nariz de uma amável esposa de um senhor ruivo.
Forçou, forçou e nada de gases.
Perdeu até o medo de cagar na cabeça da garota, mas não saía nada.
-Não vai rolar! - disse Albert
-Ah! Então é a comida do "Le Château"! Eu bem que desconfiava, porque depois que eu comecei a comer lá, nunca mais tive gases, e olha que tenho úlcera.
-Pode deixar que eu não como mais lá. - Albert disse como funcionário proativo que estava se tornando.
-Esqueça, eu também não vou comer. Seus serviços não são mais necessários aqui. Pode se retirar, por favor.



Grito Número Oitenta:

sábado, 12 de março de 2011

SOBRE O MAR MORTO E BURACOS NA PISTA

Estava eu a ler um texto sobre o Mar Morto, aquele do Oriente Médio extremamente salgado, e me deparei com um comentário do autor que dizia que lá é o ponto mais baixo da Terra, estima-se algo entre 400 metros abaixo do nível do mar,
ou seja, é uma depressão absoluta.
Passou um minuto e pensei, que os homens que classificaram o mar morto definitivamente não conhecem o coração de um homem triste, afundado milhas abaixo do nível, não só do mar, mas como de qualquer outro lugar (ou não-lugar); isso sim é a depressão mais absoluta.
Mas do mesmo jeito, se cobrirmos tudo com muita terra, tudo se resolve, o nível vai subir, mas acabaremos por vez abrindo um outro buraco em algum outro lugar.
E foi assim que voltei a amar, como o homem que tenta matar o mar morto o cobrindo com terra. Abrindo novas feridas e enterrando meu coração de homem triste com sete palmos de areia por cima.
Mas é provavel, assim como que o Mar Morto não vive, que irei a qualquer tempo despencar nas novas crateras que me encarreguei de escavar.

Grito Número Setenta e Nove:

quarta-feira, 9 de março de 2011

SOBRE A UTOPIA DE MORUS, ATINGIDA ÀS 02:33a.m. DE UMA QUARTA-FEIRA DE CINZAS EM UMA CADEIRA DOBRÁVEL, SER DESTRUÍDA EM MENOS DE QUATRO SEGUNDOS POR APENAS UM SER HUMANO MISERÁVEL...

Toda uma sociedade se cansa da falta de catarse nos sentimentos reprimidos.
Uma flor de narciso nasce do meio do catarro e gelo. Um mendigo lendo "A Gaia Ciência" enquanto jaz de bruços em um sofá imundo e abandonado que em questão de dias se tornará apenas um pedaço de espuma imperecível.
Imperdoabilidade ao jogar tijolos em financeiras. Rostos cobertos por bandanas vermelhas.
Deusas indianas de braços arrancados, crucifixos descartados e minaretes tombados e ruídos.
Não há mais dinheiro, consequentemente não há mais o que dever.
"O Capital" foi substituído por "O Pequeno Príncipe".
"Desde 1967 trabalhando em pleno inverno, todos esses anos. Que o teto e o piso salarial se fodam. Eu quero sonhar! Durante os invernos da minha vida, eu quis conhaque e jazz, era só isso que eu queria mesmo, caralho. Um brandy Gold Napoleon e um vinil do Sinatra no lugar dessa porra de neve, nunca pedi demais!" - Discursava o jovem senhor de cabelos grisalhos num tom quase religioso.
Crianças em seus doze anos tombam ônibus e incendeiam livros de equações de segundo grau.
Se aquecem nas chamas enquanto entre risadas desfrutam de Salinger e "As Flores do Mal".
Comem doces de marzipã e bebem sucos azulados nas embalagens de revólver.
Uma bandeira negra, apátrida, balançando tímida pelo pouco vento naquela noite gelada anuncia o fim das fronteiras.
O fim de mil eras de grilhões mentais.
O início de tudo que estivera um dia em represália por ser bonito demais para existir.
Então, um jovem metido a escritor, coração de boêmio e barba por fazer, mesmo estando feliz com o resultado e crendo no potencial futuro de reconstrução que estava por vir, estragou e ruiu tudo com apenas dois pequenos atos.
Abriu seus olhos esverdeados que cerrados estavam há alguns minutos e acordou.




Sugestão pós-leitura desse devaneio todo é a música-tema de Clube da Luta, executada pela banda Pixies, que casa perfeitamente com a intenção do texto.

Grito Número Setenta e Oito:

segunda-feira, 7 de março de 2011

Sobre Ratos e Framboesas....





Por algumas vezes meu coração palpitou como o de um rato, que por migalhas se desbrava pelas ratoeiras de restaurantes imundos. Sem hesitar e sem maiores medos além do batuque de seu pequeno e peludo peito acinzentado, ele encontra as migalhas desprezadas por cozinheiros gordos e suados e faz seu festim com tão pouco.
Os ratos vivem nos esgotos e se alimentam de migalhas desprezadas.

São cegos e satisfeitos.

Cegos como eu e meu coração que palpitou como os deles, por todas as vezes que cruzei com mulheres no meu caminho que pareciam finas como damascos e tâmaras, mas eram, na verdade, migalhas de cozinheiros gordos; vadias sem essência ou conteúdo. Apenas o resto das sobras do desprezo.
Eis que deixei de ser rato quando provei da suavidade de teus lábios de framboesa e aspirei o perfume de café fresco de tua pele.
Abandonei meus tubos de esgoto, estou exposto para sempre, como um camundongo em uma grande avenida repleta de restaurantes refinados.
Tenho que estar sempre a me preocupar com pisões e raticidas, mas quando sorvo do néctar
dos teus seios, posso, assim como os meus velhos amigos roedores, flutuar pelas ratoeiras e se, por ventura ou destino, alguma delas se desarmar contra meu corpo, estarei de barriga cheia e morrerei satisfeito, pleno e feliz, assim como qualquer roedor que abandonou as migalhas em troca de framboesas frescas.



Texto em honra a minha amiga, mulher e musa inspiradora, Michele "Nena" Matsubara.

Grito Número Setenta e Sete:

domingo, 6 de março de 2011

SOBRE SER VERDADEIRO E PAPO DE ELEVADOR

Quem me conhece, ou já realizou em minha companhia
Uma daquelas noitadas fatídicas
De filosofia de botequim,
Sabe que eu sempre falo disso tudo
Para todos.
De quando quando uma pessoa faz as coisas
Pinta, escreve, fode, canta, etc.
Tem o dever de ser verdadeira.

Não adianta vir com sentimento de elevador
Ou emoções primárias.
Porque no elevador a gente é coagido a dizer que o tempo esfriou
E olhar pro chão depois
Esperando o "plim" da sineta, para sair daquela situação de merda
Que é ficar dentro do elevador,
Fingindo estar numa boa,
Quando se está esperando qualquer coisa vir a seguir
Ou rezando para ele despencar por vinte andares.

Grito Número Setenta e Seis:

sexta-feira, 4 de março de 2011

SOBRE ELEFANTES COLORIDOS E ESPATIFADOS
Um elefante, desses acinzentados e gigantescamente atarracados, arranjou mil tinturas com babuínos curandeiros. Pintou a tromba de cor-de-abóbora e o corpo todo de amarelo-queimado. Usou uma tinta branca para seu tórax e laranja em suas patas. Denodado, se jogou de um penhasco, cheio de pose e garbo, para seu vôo de libertação. E ainda assim, nada disso fez dele um canário.

Grito Número Setenta e Cinco:

quarta-feira, 2 de março de 2011

A Noiva de Vermelho

O rosto se encontrou pálido
Alvo como o vestido tão belo que mal usara
O cheiro da morte elucidava o acontecido
Os olhos sem brilho espalhava o fosco gris por toda cara

O menino-deus ao canto não podia encará-la
As pinturas de bispos beneditinos de vermelho respingadas
Assim como tudo ao redor desta sagrada sala
De vermelho, de impacto e de sangue lavadas

De velhos amores, de certos rumores e do instante das dores
O semblante dos velhos retrados rasgados de anos se fez regressado
E sorria contente depois que todos os outros presentes neste sacramento que até então comemoravam...

(...mas houve um velho motivo para calaram-se para sempre)

O ciúme das flores, o misto de cores com o vermelho dos dissabores
Ilustaram o massacre, de um homem frustrado que segurava um machado
Todo o clero, todos os entes e os noivos malditos que perdiam seus dentes, neste casamento pagaram...

(...até mesmo o meu fruto que se dava por perdido em seu ventre)