Grito Número Cento e Cinquenta e Três:

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Personagens da História da História de uma História 
(ou A Menina Que Gostava de Sangue)


De lápis apontado em seu caderninho de notas, a garotinha sardenta e de cabelos ruivos começou a traçar um conto impróprio:

"Um filete de sangue escorre pelo peito e tem como nascente a garganta do violador. Um corte pequeno e não-letal.
 -Por favor, não faça isso! - disse o homem amarrado.
-Cale-se. - disse a moça enquanto amolava a faca.
-Pelo amor de Deus, eu imploro.
-Deus não vai te ajudar agora, amigão.
A lâmina entra dois centimetros pelo umbigo e desenha um sinuoso e vermelho caminho. 
Ecoavam ganidos. Era clara a dor. Vômito pelo chão. Ataque convulsivo e histeria.
E eu, sentada, ria sem parar da dor que ele sentia."

Já estava tudo isso escrito no papel e a menina sonhadora esperava ansiosa ou pela oportunidade de publicar suas linhas sangrentas, ou pelo dia que realmente isso pudesse acontecer. 
Seu sonho não era ser escritora, era ser personagem.
E um dia, um cara de óculos e barba que queria ser escritor escreveu um texto chamado "A Menina Que Gostava de Sangue" e a ruivinha virou personagem.
Mas quando escreveu o texto, o barbado se colocou na história e virou personagem com a sardenta. 
E todo mundo quando leu esse texto virou personagem também.
E essa é a história da história dos personagens dessa história sem sentido algum.

Grito Número Cento e Cinquenta e Dois:

domingo, 15 de janeiro de 2012

ADAGA E ESPELHO

Estava por baixo, tudo azul de tristeza e problemas.
Era um homem bom, não poderia sofrer sem motivos, a culpa era de alguém, era a hora de lutar.
Pegou o papel, já amarelado pelo tempo e passou a vista pela lista dos culpados de suas escaras.
O único nome em sua lista negra era o seu próprio nome.
E deu início ao combate mais árduo de todos os tempos.

Grito Número Cento e Cinquenta e Um:

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

A INCRÍVEL (E CURTA) HISTÓRIA DO HOMEM QUE FOI E FICOU AO MESMO TEMPO


A carne e as vísceras se foram; ao pó retornaram.
Quedaram em terra nada além de seus ossos e cabelos, suas páginas, a ideia e a poesia por detrás de tudo.
Em volta, os muitos que choravam à lápide não pensaram que os esqueletos estão sempre a sorrir.
E, meu deus, como aquela nova aquisição da indesejável de veste escura gargalhava de satisfação.

(RIP - Daniel Piza

Grito Número Cento e Cinquenta:

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

MÁGICA

Milhares de pessoas estavam pelas ruas, o clima estava quente, porém a garoa fina amenizava o calor de uma multidão ansiosa. Eis que dois olhares conhecidos se encontraram na multidão; havia tempos que o par de olhos negros e brilhantes não encontravam com aqueles olhos esverdeados de mistério. Ambos sorriram de imediato e correram ao encontro um do outro.
O cancioneiro, a celebração popular e os fogos de artifício começaram no mesmo instante do estalo do tímido e morno beijo do amor recém-(re)nascido.
Era fato que fora apenas uma perfeita coincidência, tanto do encontro, quanto da sincronia com o festejo, deixando este ainda mais eufórica a sensação, mas não houve ninguém, em todo aquele aglomerado de gente, que os convencesse que aquilo tudo não era minimamente arquitetado somente para os dois. 
Era ano novo, e tudo que era velho, era novo também.