GATO XADREZ
Grito Número Sessenta e Quatro:
Postado por Dan Arsky Lombardi às 20:43 1 comentários
Grito Número Sessenta e Três:
Um baobá cheio de corvos.
Seus bicos amarelos iluminam o ambiente lúgubre.
Seus grasnados ecoam uma melodia infernal.
Olhos arrancados de corpos estão perdidos meio aos galhos, qual enfeites natalinos.
Abandonados por abutres que deixaram de lado a carniça para tornarem-se urubus-rei.
Mas de rei esse urubu só tem o título.
As flores do dia de finados já estão secas e formam um colorido de tons pastéis tristes e amarelados.
Um crisântemo branco agüenta o sol de dezembro com afinco.
Esbanja vida adornando a morte dos outros.
Arco-íris de arame farpado.
Prato de alumínio levemente amassado e vazio.
Criança cheia de catarro e fome.
Um velho esquálido com camisa vermelha de propaganda de partido político de esquerda pega latas do lixo e engorda seu saco surrado de estopa.
Chuva de verão, molha tudo ao mesmo tempo em que o sol torra a todos.
“Casamento de espanhol” dizem das janelas as velhas que olham matreiras o movimento dos vizinhos e da travessa em que moram.
Escola vazia, rua imunda, vômito da véspera festiva.
Silêncio mortal da manhã.
O presidiário tirou férias da cadeia para bater em sua esposa e cheirar um pouco de pó, só volta dia dois do ano que vem para sua gaiola falha e degenerada.
Um senhor gordo fuma cachimbo em sua varanda observando as folhas secas.
Uma criança rica doa um carrinho sem rodas para uma criança pobre que recebe como se fosse uma barra de ouro.
O tal deus-menino fugiu do presépio e toma conhaque sozinho em outro planeta, se recusa a participar de festa surpresa onde não pode escolher seus convidados.
E nessa festa só dá gente chata.
Resto de rojão, garrafa vazia de sidra de maçã.
Amor entre os homens, falsidade entre as famílias, boa-vontade passageira.
Feliz natal de carne.
Feliz natal de osso.
Porque são só os ossos que sobram para maioria.
Postado por Dan Arsky Lombardi às 19:25 3 comentários
Grito Número Sessenta e Dois:
Postado por Dan Arsky Lombardi às 10:18 4 comentários
Grito Número Sessenta e Um:
Sem tempo para pensar em títulos.
Acorda, pega a primeira camisa que encontra no armário e engole um pão no caminho.
Não dá tempo de escovar os dentes, de dar bom dia, de pensar.
Encara oito pilhas de papel, de
Pareciam totens de tribos canibais.
Sem agilidade seria devorado pelo expediente.
Lê, cataloga, arquiva.
Lê, cataloga e arquiva.
Começa a cantarolar uma canção da década dos homens de chapéu coco.
Percebe que catalogou tudo errado.
Começa tudo de novo desde o começo da canção.
Pensa em entrar para um coral, mas não daria tempo.
Pensa em fazer um esporte, mas não daria tempo.
Pensa em ter mais tempo, mas arquiva tudo errado de novo.
Pausa para o café, bebe dois copos descartáveis.
Coloca o copo na lixeira que diz orgânico, pois já está tudo misturado mesmo.
Serviços bancários, fila, metrô, acende um cigarro no caminho de volta.
-É um assalto.
Perde os documentos.
Não quer mais ter RG.
Não quer mais saber de CPF.
Cansou do padrão, mas nunca soube ser ovelha desgarrada.
Cansou de frases soltas.
Tirou a gravata, deitou em sua cama.
Acendeu um cigarro, serviu um conhaque.
Rezou para Nossa Senhora Aparecida.
Dormiu.
Acordou.
Voltou a dormir.
Abriu os olhos mais uma vez e apanhou a carteira de cigarros da cômoda.
Acendeu outro cigarro e fez um café.
No primeiro gole do café, se encontrou.
E estava lendo, catalogando e arquivando.
Mas estava tudo errado e tinha que começar aquilo tudo de novo.
Postado por Dan Arsky Lombardi às 10:42 1 comentários
Grito Número Sessenta:
Postado por Dan Arsky Lombardi às 18:57 3 comentários