Grito Número Duzentos e Cinco:

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Suplício em Silício

Pulula do cerne a questão:
Seria eu de fino vidro, ou não?
Sei que fitas e me enxergas
E isso me faz de carne forte e fraca das pernas.
Mas sinto esse velho peito de puro estilhaço
Resto de caco, desejo e embaraço
Mudo brado loquaz em canção me estilhaça
Queria ser de aço ou estar inserido em couraça
Mas é só um suspiro, um trepidar e a dúvida já me quebra a vidraça.

Grito Número Duzentos e Quatro:

terça-feira, 2 de julho de 2013

DAS GRANDES DECEPÇÕES DA VIDA


Pensava eu que era amor.
E era mesmo.

Grito Número Duzentos e Três:

quarta-feira, 22 de maio de 2013


ANGÚSTIA O QUE CUSTAR

O que o conhaque não cura
O cigarro queima e segura
A zonzura que aperta e apura
Aquilo tudo que me moi.
E para não ficar na tortura
Busco ternura no colo
De uma qualquer criatura
Ao mesmo tempo em que o pequeno diabo de dentro me destroi.
Não é só o amor, viver também doi.

Grito Número Duzentos e Dois:

sexta-feira, 17 de maio de 2013


LEMBRAR DE MIM, TODA VEZ QUE RESPIRAR, LEMBRAR DE MIM, SE EU NUNCA MAIS VOLTAR

É pateticamente óbvio, mas eu já fui um menino. Tentava forjar uma barba cartunesca e tinha pôsteres na parede. Chamava meu quarto de "O Calvário" e queimava mentolados olhando para as estrelas, debruçado na janela.
Hoje, a barba está mais grossa, larguei o tabaco e no quarto, agora chamado apenas de "quarto", não tenho nada na parede que não esteja em uma moldura. A constante "cachaça com soda" da alegria deu lugar ao esporádico conhaque da melancolia. Minha dezena de furos na orelha estão fechados e meu cabelo está curto, com sua cor natural e uma mecha pequenina de fios brancos de lambuja.
Mas ainda olho as estrelas de quando em vez. Ainda suspiro muito, talvez até mais do que antes, e ainda digo "ai, ai", com uma tépida ternura, depois de suspirar, como se eu sentisse todas as dores do mundo e sorrisse para elas, tal e qual velhos amigos de boteco.
Nesse tempo de menino, sonhava em viajar para o futuro, para visitar a mim mesmo e sondar por onde andariam meus passos. Hoje, eu só penso em voltar e me dar um abraço forte.

Grito Número Duzentos e Um:

segunda-feira, 6 de maio de 2013


ESCRITOS ESCROTOS

Dizer "vai tomar no cu" é o mesmo que dizer "eu amo você".
No fundo, bem lá no fundo, você sabe que são somente outras palavras.
Vem daquele lance de se importar, da tênue linha onde o amor se equilibra embriagado de vinho barato.
A diferença é que o "amo você" é dito ou escrito por caras escrotos.
Sou um cara escroto, antes de tudo. E assim é o amor dos caras escrotos. Entre amores e pompons.
E no fundo, é ipsis literis ao amor bandido, muda o layout e a gramatura das palavras.
Quem não gosta, é porque tem cinzeiro de boteco no lugar do coração. Aliás, o problema não é desgostar: é não entender sua existência. E a esses desgostosos com as distintas formas de amor, que recebam todo o meu amor, e enfiem no cu.

Grito Número Duzentos:

terça-feira, 16 de abril de 2013


ELE E UMA NEUTRALIDADE IRRITANTE

Era uma quarta-feira como qualquer outra, o início do verão verdejava os canteiros da cidade e fazia molhar as camisas, dando assunto a todos para conversas de elevador.Até então era isso, verão, calor e ele saiu do escritório para entr
ar no elevador.

-Calorão, hein? - disse o ascensorista.

Ele respondeu arqueando uma das sobrancelhas grossas.
Térreo, campainha e rua. 
Ele trabalhava em um prédio comercial espelhado próximo ao centro. Enquanto afrouxava a gravata estampada em tons espectrais quase neutros, entrou num boteco e sentou-se ao balcão.

-Café, por favor. - as primeiras palavras do dia saíram com esforço de sua boca, finalmente, no final da tarde.

Fumegando, no copo americano, o café foi servido. Tomou em dois goles, parecia sem gosto. Permaneceu passando os dedos no copo e olhando o longe, o perto, os transeuntes trabalhadores e os trabalhadores transeuntes.
Eis que um grupo de colegas de trabalho chegam ali para um happy hour, falando e rindo alto, fazendo piadas sobre times de futebol. Aquilo parecia medíocre aos olhos dele. Rir parecia medíocre aos olhos dele; era como se fosse fácil demais, porém não estava entristecido. Não era triste, nem feliz, em suas veias bombeava aquela neutralidade irritante.

-Você por aqui! Não é de beber! Café? Tem que tomar uma loira gelada com a gente, malandro.

Arqueou a sobrancelha, a mesma que calou o ascensorista, como resposta. Não calou o colega, mas tirou-lhe o sorriso da boca.

- Tá esperando alguém? Aconteceu alguma coisa? - disse o colega curioso e com uma serenidade forçada.
- Não. Estou só esperando algo. - respondeu.
- O quê? - questionou o colega, mais rápido do que pode-se imaginar.
- Estou esperando bater aquela tristeza.
- Pra que isso, cara?
- Para que eu possa esperar ela passar.

Ele levantou-se letargicamente, deixando uma nota de cinco embaixo do copo vazio e saiu do bar para uma longa caminhada, talvez a mais longa, talvez a mais curta de sua vida. Mas isso já não importava.

Grito Número Cento e Noventa e Nove:

quarta-feira, 20 de março de 2013


Grito Número Cento e Noventa e Oito:

domingo, 17 de março de 2013

YOU CAN CALL ME (YOUR) DR. TOM


I wait your calls at midnight
I'm here to prove you're right

I'm here to make you feel like gold
When you're feeling like a dime

I always dream about your smile
Saying me that everything it's fine
Our laugh is ours
Your hapiness is mine
Count on me forever
It's not a question of time
Finish up your drinks and we can say goodbye
Or at least we can try.


Grito Número Cento e Noventa e Sete:

domingo, 24 de fevereiro de 2013

LUGAR CERTO


A gente tenta disfarçar a cara amarrada
Toma providência pra encontrar distração
A gente tenta acomodar o coração
Mas caixa é caixa, almofada é almofada...

Grito Número Cento e Noventa e Seis:

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

ALTEZA INERTE

Apocalipse 3:15, 16 - "Conheço as tuas obras, 
que nem és frio nem quente; oxalá foras frio ou quente! 
Assim, porque és morno, e não és quente nem frio, 
vomitar-te-ei da minha boca."


E a princesa foi lá e fez...
Ela vivia enclausurada entre as masmorras e permanecia em uma alcova-cela não muito grande. Fora presa uns anos antes por um bando de saqueadores, caçadores de recompensa e gente da pior espécie, pessoas que agiam tal e qual Gengis Khan e sua corja. Seu antigo castelo fora dominado por estes homens que mais lembravam trasgos, ogros e criaturas do gênero, sujos e grosseiros.
O grilhão que assegurava que seus pés permaneceriam quietos eram prateados como os seus cabelos e seu quarto era triste e úmido. Havia apenas uma pequetita janela pela qual entrava um feixe de luz matinal que banhava seu semblante pela manhã. 
Pensava nos pássaros e na razão dos homens engaiolarem os mesmos, também pensava constantemente nos passados tempos quando era tão somente uma princesa ansiosa por sustentar uma coroa dourada em seu cocuruto. Pensava no seu pai decapitado e de trono usurpado pelo bando, em sua pobre mãe e rainha, violentada e morta como um cordeiro para oferenda. Fugindo dessas lembranças nefastas e sombrias, passou a sonhar acordada com dias melhores. Tão óbvio quanto em qualquer conto de fadas, sonhava com um príncipe galante que a tiraria daquele lugar e que lutaria com seu sabre afiadíssimo por todos que tentassem impedí-lo.Sonhou tanto que já havia decorado as falas de seu sonho repetido. Sonhou tanto que seu príncipe inerte já não era mais quente, mas não chegava a ser frio: era morno. Um tepidez torpe e enjoada, uma tepidez de causar vômito. 
Quando se viu enjoada de seu sonho pueril e libertador, a princesinha em um ataque de fúria mortal mordeu a corrente que ligava o grilhão de prata à grande pelota de ferro negra e seguiu mordendo até não restar dentes da frente.
Cheia de dor e sangue escorrendo pelos seus lábios delicados, percebeu que seu esforço tivera resultado, seus dentes maceraram um dos elos da corrente. Ainda que o elo macerara seus dentes de volta, estava solta.
Correndo alucinadamente, topou com um guarda e roubou-lhe o sabre em uma manobra ousada. A cabeça rolou pelo assoalho de madeira rústica. E rolaram todas as cabeças possíveis pela lâmina de Vossa Alteza. Ela havia restaurado seu reinado e conseguiu um belo conjunto de dentes de pérola para substituir os que foram perdidos no esforço. Não conseguiu parar de sorrir nunca.
Enquanto esperava sonhadora e sorridente pelo príncipe em inércia, tudo era uma espera, mas quando se propôs a perder os dentes, retomou todo o controle.
Depois de ser feita rainha em cerimônia e ovacionada por sua bravura indomável por seus novos súditos,  devorou carnes flamejantemente quentes e tornou alguns cálices de vinho mais gelados que os topos dos alpes. Pelo morno não valia mais a pena esperar. Tudo que era morno, para Vossa Majestade, era agora intolerável. 

Grito Número Cento e Noventa e Cinco:

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

DIARIAMENTE

Primeiro o direito, depois o sinistro
Abro meus olhos, existo
No início da manhã.
Quando brota uma história
Em minha mente, memória
Já não tão sã

Lembro do barco a partir
Da estrutura a ruir
E de tanto calo no dedo
De quando, sem medo,
Folheio as páginas
Sem fugir, e sem mentir
Esqueço das lágrimas lá
Enquanto as falhas farfalham no mar

Toda manhã poderia não ter o porvir
Mas levanto da cama
Com uma vontade insana
E escolho sorrir