Grito Número Cento e Três:

terça-feira, 28 de junho de 2011

SOBRE MORTOS-VIVOS QUE ASSOMBRAM METRÓPOLES

Sempre me encantei, desde pequeno, com mortos-vivos. Sei que
essa lenda vem do vodu haitiano e tornou-se extremamente popular nos livros e nas telas de cinema. E o que me encanta profundamente é que os zumbis estão mortos e vivos concomitantemente. São pedaços de carne estragada que andam, gemem e mordem, buscando os vivos. Empunham machados e chaves-de-boca e saem a caça de cérebros e tecido vivo.
E hoje, mais do que nunca, me peguei por fazer mais uma de minhas analogias epifanistas com o espírito de Macabéa macabra que possui estes ossos. Olhando o sol pela janela do apartamento, me senti morto sabendo que estou vivo. E quero cérebros, quero carne fresca, pois estou preso nesse corpo que me conduz a uma necrópole onde não há sepulturas com meu nome e todas as lápides sustentam epitáfios que não entendo, tento decifrá-los sempre falhando. É como se sempre acabasse por me sentir tão vivo, com uma dança tão bonita para bailar para um cabaré vil.

"Há um assassino na matinê. Há cadáveres na platéia. Os produtores e atores não estão certos se o show terminou. Com olhares oblíquos eles esperam suas deixas... Mas a mascara apenas sorri."



Estou preso em meu próprio corpo. Meu pássaro azul que faz das minhas costelas uma gaiola, não tem vontade de cantar. Ele precisa voar para ter inspiração. Portanto, meu corpo zumbi espera com ansiedade o momento em que o balaço encontrará o meio de suas têmporas e sua alma irá voar para o horizonte, qual pássaro azul. E o batuque do atabaque de vodu haitiano, que eu mesmo tocava, deixará de ecoar em meus ouvidos de morto-vivo para todo o sempre.

(Existe amém para bastardos sem glória?)

1 comentários:

Patrícia Müller disse...

Mortos vivos somos todos, alguns percebem, outros vivem na ilusão... afinal, se a única certeza que temos é a morte, já estamos mortos.

Não sei se existe amém para bastardos sem glória, não sei mesmo...